Uma das grandes inovações trazidas pela Lei n. 14.133/2021 foi a previsão de uma nova modalidade de licitação, denominada de “Diálogo Competitivo” (art. 28, V), por meio da qual serão realizados diálogos com licitantes pré-selecionados, visando desenvolver alternativas capazes de solucionar/atender os problemas/demandas da Administração Pública.
A inserção do Diálogo Competitivo na Lei n. 14.133/2021 está diretamente relacionada a um dos seus novos objetivos, qual seja o incentivo à inovação (art. 11, IV), sendo certo que tal modalidade tem como finalidade primordial a busca por soluções técnicas mais inovadoras e que melhor atendam ao interesse público envolvido na contratação.
Nesse contexto, nos termos da Lei (art. 32), o Diálogo Competitivo não poderá ser utilizado em qualquer licitação, mas somente nos casos em que: (i) o objetivo for a contratação de objeto cuja especificação técnica não pode ser definida com precisão ou que envolva inovação tecnológica/adaptação de soluções de mercado; ou (ii) não for possível a definição, pela própria Administração Pública, dos melhores meios/alternativas para solução do problema.
Como se depreende, essa nova modalidade busca viabilizar uma maior cooperação entre a Administração Pública e o setor privado, acreditando-se que, assim, a identificação de melhores soluções para os problemas apresentados ocorrerá mais facilmente. Há aqui, portanto, um reconhecimento do legislador sobre as limitações técnicas e operacionais da Administração Pública, que nem sempre terá condições de analisar a situação concreta com a profundidade necessária para definir o melhor caminho a ser seguido (solução técnica).
Assim, dada à relevância do Diálogo Competitivo, elencamos abaixo as principais vantagens desse novo modelo licitatório, bem como os desafios que podem ser enfrentados para a sua implementação no cenário nacional.
As vantagens do Diálogo Competitivo são as mais diversas. A primeira e mais óbvia delas é promoção de soluções inovadoras, na medida em que a referida modalidade licitatória permite que o poder público e os particulares discutam as necessidades e os desafios envolvidos na execução do objeto a ser contratado, levando à identificação de soluções mais assertivas, que prezem não apenas pelo preço, como também pela qualidade e inovação. Alinhada com a promoção da inovação, o diálogo competitivo também tem como condão proporcionar maior segurança jurídica às contratações públicas, uma vez que permite que a Administração Pública alcance maior compreensão acerca das alternativas e dos riscos envolvidos na contratação, proporcionando um maior alinhamento entre os interesses e as expectativas das partes contratantes e, por consequência, maior aderência e estabilidade à solução contratada.
Outra vantagem da modalidade licitatória em comento é o incentivo à concorrência, na medida em que possibilita a participação de um número maior de licitantes do que os demais modelos licitatórios previstos na Lei n. 14.133/2021, levando a preços mais competitivos e melhores soluções. O diálogo competitivo também permite maior acesso a novos serviços e produtos, mesmo aqueles de maior grau de complexidade, possibilitando a prestação de um serviço público mais eficiente por parte da Administração Pública e, como decorrência, melhor atendimento aos interesses da coletividade.
Em outras palavras, pode-se dizer que o diálogo competitivo se trata de procedimento licitatório flexível e transparente, no qual se privilegia a negociação, conferindo segurança jurídica ao Poder Público, em face da necessidade de contratar objetos de maior grau de complexidade.
Há de se destacar, no entanto, que, apesar de se tratar da grande novidade trazida pela Lei de Licitações, o diálogo competitivo não se resume apenas a vantagens. O novo modelo licitatório também tem despertado muitas dúvidas quanto aos seus contornos e aplicação no sistema jurídico brasileiro, sendo inerentes os desafios na sua implementação. Nesse sentido, a primeira dificuldade que se pode citar é em relação à existência de diversos termos e expressões vagas utilizadas pela Lei n. 14.133/2021, a exemplo do que ocorre no inciso I, do art. 29.
O referido dispositivo legal, ao dispor acerca das condições que devem envolver a licitação, utiliza-se de expressões como “inovação tecnológica ou técnica” e, ainda, “possibilidade de execução com diferentes metodologias”, sem, contudo, apresentar qualquer definição acerca do significado no caso concreto das referidas expressões. O mesmo também se verifica em relação ao inciso XI, do art. 32, que, apesar de tratar da comissão de contratação necessária para a condução do diálogo competitivo, carece de contornos mais concretos e transparentes no que concerne à tramitação do procedimento licitatório.
Outro desafio que pode ser destacado é relativo à ausência de quadro técnico especializado para a condução do certame, em especial no âmbito dos entes municipais, que muitas vezes sequer possuem servidores concursados para a condução de suas licitações. Considerando que, diversas das soluções que serão apresentadas à Administração Pública por meio do diálogo competitivo terão caráter notadamente técnico, é de suma importância que os gestores encarregados da condução do procedimento licitatório possuam a expertise técnica necessária para formular um edital que viabilize a competição, com critérios objetivos para a escolha da proposta mais vantajosa, conforme preconiza o art. 32, §1º, da Lei n. 14.133/2021. Com efeito, a construção de um corpo técnico habilitado pode acabar se tornando um desafio a também ser enfrentado pelo Poder Público.
Outra dificuldade que também vale ser mencionada é em relação ao custo de operacionalização do diálogo competitivo tanto para o setor público, quanto para o setor privado, tendo em vista as diversas fases que constituem a referida modalidade licitatória, demandando não apenas tempo, como também pessoal qualificado e disponível para executar as tarefas previstas em Lei. Para além desses pontos, também pode se mencionar como desafio inerente ao diálogo competitivo o estímulo à participação de interessados. Isto porque, em razão da própria natureza do procedimento, é exigido dos particulares que desenvolvam estudos complexos, sem qualquer garantia concreta de que serão contratados. Tal fator pode acabar limitando a participação no certame apenas de agentes econômicos que tenham especial capacidade de assumir riscos, indo contra ao próprio objetivo do diálogo competitivo, que, como já mencionado, é justamente promover contrações mais eficientes, transparentes e céleres.
Todos esses pontos, apesar de não consistirem propriamente em desvantagens, tampouco impedirem a incorporação do diálogo competitivo no ordenamento jurídico pátrio, deverão ser objeto de especial atenção pelos gestores públicos no momento de implementação da referida modalidade licitatória, a fim de que o seu principal objetivo, qual seja, proporcionar contratos mais seguros e estáveis, não seja desvirtuado.
Como se verifica, o diálogo competitivo, sem dúvidas, trata-se de ferramenta capaz de contribuir de forma significativa para efetividade, transparência e celeridade das contratações públicas.
Não obstante, por se tratar de instituto ainda novo no ordenamento jurídico brasileiro, é certo que ainda precisa ser objeto de debate pelos aplicadores do direito, a fim de garantir a sua escorreita aplicação e alinhamento com a realidade dos mais diversos entes administrativos. Para que isso ocorra, no entanto, é essencial que o instituto comece a ser aplicado na prática, tendo em vista que somente assim será possível avaliar a real eficiência dessa modalidade licitatória e os pontos que precisarão ser ajustados.