Em Sessão realizada no dia 25/05/2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) proferiu o Acórdão n. 1142/2022, por meio da qual manifestou o entendimento de que o contrato administrativo celebrado com preço superior ao de mercado não pode configurar negócio jurídico perfeito e tampouco ser protegido pelo princípio da segurança jurídica.
O referido Acórdão foi proferido no âmbito de uma Tomada de Contas Especial (TCE) instaurada para apuração de irregularidades nas obras de reforma e ampliação do Aeroporto de Congonhas/SP, dentre as quais, destacava-se a inclusão indevida de percentuais de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) no BDI do Contrato pelo Consórcio executor.
Em sua defesa, o Contratado aduziu que não poderia ser exigido o ressarcimento dos valores previstos no IRPJ e CSLL, já que tal orientação somente se tornou cogente em 2007, com a prolação do Acórdão n. 950/2007-Plenário, enquanto o contrato datava de 2004. Assim, no seu entendimento, não seria adequada a aplicação retroativa desse entendimento, sob o risco de violação expressa do art. 24 da LINDB, o qual veda que sejam declaradas inválidas situações plenamente constituídas, com base em mudança posterior de orientação geral.
Ao analisar o caso, inicialmente, o Ministro Relator, Jorge Oliveira decidiu por acatar o entendimento do Consórcio Contratado, sob o argumento de que a jurisprudência do TCU vinha se mostrando favorável à manutenção do IRPJ e da CSLL nos contratos firmados até a data de publicação do Acordão n. 950/2007-Plenário, de modo que não se mostrava razoável a manutenção das irregularidades referentes aos aludidos tributos. Contudo, o seu posicionamento acabou não sendo acolhido pelo Ministro Revisor, Benjamin Zymler, que solicitou vistas dos autos.
Em seu voto, Zymler apontou que, apesar da jurisprudência da Cortes de Contas entender que a simples discriminação do IRPJ e da CSLL no BDI não caracteriza sobrepreço, no caso em exame, havia elevada superestimativa nos custos diretos do contrato, o que permitia a aplicação retroativa da linha de entendimento que se firmou a partir do Acórdão n. 950/2007, como forma de evitar que o particular fosse beneficiário de direito subjetivo ao superfaturamento.
Isto porque, segundo explicou o Ministro, “ainda que o art. 24 da LINDB confira ao particular o direito a não ter o contrato que celebrou com a Administração Pública afetado por mudança posterior de entendimento no âmbito das esferas administrativa, controladora ou judicial, para que esse direito possa ser exercido é preciso que o preço ofertado esteja de acordo com os parâmetros de mercado”, o que não teria sido verificado no caso concreto.
Diante disso, para o Ministro, não seria razoável isentar o particular de responsabilização, considerando que este havia oferecido preços em desacordo com o critério da economicidade, bem como participado de uma relação contratual eivada de vícios, sob o risco de, ao contrário, estar-se “admitindo, de maneira implícita, a existência de um direito adquirido ao superfaturamento, o que, sem maiores digressões, soa despropositado”.
Ao final, a divergência instaurada por Zymler foi acatada em sua integralidade pelo Ministro Relator, que entendeu que, de fato, “as discussões dos autos extrapolavam os conceitos inerentes à confecção do orçamento, à composição do BDI e à jurisprudência do TCU existente à época da contratação”, concluindo pela manutenção das irregularidades apontadas quanto ao IRPJ e à CSLL.
O Acórdão pode ser consultado na íntegra através do link: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/*/NUMACORDAO%253A1142%2520ANOACORDAO%253A2022/score%2520desc/2/%2520